Eis aqui o primeiro texto que publiquei na vida

Fuçando na minha caixa de entrada do email para tentar apagar alguma coisa, descobri um email que mandei para Mario Evangelista, meu primeiro editor-chefe, no Jornal de Piracicaba, pedindo emprego. Como ainda não tinha trabalhado em lugar nenhum e meu currículo cabia num post-it, enviei em anexo um artigo que eu tinha escrito e que havia sido publicado no Jornal da Cidade, em Bauru, em 2003, quando eu ainda assinava com "Almeida" e minha mãe achava o máximo. Segue:


O mercado das cotas


Maria Fernanda de Almeida Ribeiro

Com a reserva de vagas nas universidades públicas para negros, pardos, índios e pobres o Brasil cria o profissional das cotas.

A idéia que permeia todos os setores sociais do país de vincular emprego à educação, que se estabelece como uma ligação de causa e efeito, não considera inúmeros elementos políticos e econômicos que influem nessa relação. Não se trata de negar os benefícios que a educação traz, muito menos negar que a relação escolaridade e emprego não existe e que é fundamental para a inserção no mercado de trabalho, mas somente facilitar o ingresso de determinadas classes nas universidades está longe de ser suficiente. Pois elevar o número de universitários no país não levará a criação de empregos, o que depende de uma sociedade mais igualitária e de uma política econômica e cultural voltada ao bem estar coletivo.

As estatísticas comprovam o grande número de profissionais diplomados que estão desempregados e que, muitas vezes, se sujeitam a empregos fora de sua área de atuação, ou sub-empregos para poderem ganhar algum dinheiro.

É preciso ressaltar estudos de sociólogos que atuam no ramo das ocupações e das profissões que acreditam que a identidade profissional adquirida ao longo de anos de estudo é interrompida ao entrar no mercado de trabalho, pois é mais válido seguir ordens da administração. É ela, desde a Revolução Industrial que determina qual é o trabalho a ser feito, como ele será realizado e por quem; fragmentando, mecanizando e racionalizando as tarefas em busca de melhor eficiência e resultados financeiros. Acumular funções significa ser competente e este “modelo de competência” imposto pelas empresas causa a desvalorização do diploma.

Afinal, para ingressar no mercado de trabalho é necessário muito mais que isso. Fluência em línguas, cursos no exterior, dinâmica, bom para trabalhar em grupo, conhecimentos técnicos e especialização são apenas alguns dos muitos pré-requisitos para conseguir um emprego, o que não significa que será na sua área de formação, por isso, a perda da identidade profissional.

O sistema de cotas para as universidades é uma solução em curto prazo, sem pensar nas conseqüências futuras, pois aqueles aprovados por esse sistema não entrarão no mercado por mérito e sim devido a grande desigualdade social existente no país que não desaparecerá através das cotas. Afinal, potencial, habilidade e competência são independentes do fator raça/cor. Sem citar que anos de estudos precários não serão curados através de quatro anos de estudo superior.

Transformar o ensino médio e fundamental das escolas públicas e acabar com a deficiente educação brasileira seria tarefa demais árdua para um só governo, além de exigir o desprendimento de muito dinheiro e tempo para a cansativa questão burocrática.

A educação é direito de todos e isso não deve ser discutido, e pagar a exorbitante mensalidade de uma universidade particular exige muitos recursos.

Mas apenas facilitar o ingresso nas universidades é tampar o sol com a peneira e ser um profissional que se formou através do sistema de cotas pode ser ainda mais um empecilho para o ingresso no mercado de trabalho. As empresas, provavelmente, vão querer saber se você é um profissional das cotas. Talvez seja preciso criar também cotas para exercer a profissão.

Sem falar que o preconceito histórico do nosso país continuará a existir, o ensino público deficiente continuará a existir (para que reformulá-lo se ele não é mais necessário para o ingresso no ensino superior?), os inúmeros analfabetos continuarão a existir e existirão também as famílias bem providas que colocarão seus filhos nas escolas públicas apenas para facilitar o ingresso e garantir-lhes o futuro sem desembolsar dinheiro para isso.

2 comentários:

marina aranha 25 de fevereiro de 2011 às 23:59  

olha que engraçado: se eu fuçar nos meus e-mails, vou achar o texto que enviei pra vc.

Tati F 1 de abril de 2011 às 10:24  

Amo teu jeito de escrever! Orgulho! beijos e saudades. Tati x

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